Direito ao esquecimento: sentença reconhece sua aplicação no Uruguai

Direito ao esquecimento: sentença reconhece sua aplicação no Uruguai

Na era digital atual, um dos maiores desafios ainda é a proteção de dados pessoais e o direito à privacidade dos indivíduos. A internet armazena - e permite a visualização de - inúmeros dados pessoais cujo acesso ilimitado, eventualmente, poderia afetar a reputação, vida familiar ou profissional das pessoas mesmo anos após sua publicação original.

Direito ao esquecimento: sentença reconhece sua aplicação no Uruguai

Por esse motivo, vários países começaram a consagrar expressamente o "direito ao esquecimento", pelo qual uma pessoa poderia solicitar que seus dados pessoais (sejam informações, vídeos ou imagens) sejam eliminados dos motores de busca (por exemplo, do Google) e de outros sites online.

Existe no Uruguai o direito ao esquecimento?

No Uruguai, a Lei Nº 18.331 ("Lei de Proteção de Dados Pessoais") consagra os direitos e deveres das pessoas em relação aos seus dados pessoais, incluindo o direito de solicitar a retificação, atualização ou exclusão dos mesmos em qualquer registro ou banco de dados. Além disso, a lei estabelece que os responsáveis por bancos de dados devem tomar medidas adequadas para garantir a privacidade e segurança dos dados.

No entanto, não existe uma lei específica que consagre o direito ao esquecimento no Uruguai.

Em 2018, a discussão chegou ao Poder Judiciário. Os demandantes alegavam que várias notícias atribuíam a um deles a comissão de um suposto crime, cuja denúncia havia sido arquivada há vários anos.

Em 2022, o Tribunal de Apelações em matéria Civil do 6º Turno (i) admitiu a aplicação do direito ao esquecimento no Uruguai e (ii) condenou a Google Argentina SRL e Google Inc. a "desindexar" e desvincular de seu mecanismo de busca, dados e informações pessoais dos demandantes (na sentença nº 193/022-6, confirmando a sentença de Primeira Instância do Juizado Letrado em matéria Civil do 2º Turno de Montevidéu).

A desindexação consiste em eliminar o vínculo entre a busca realizada (por exemplo, o nome de uma pessoa) e os resultados fornecidos pelo mecanismo de busca (neste caso, o Google). Dessa forma, o nome da pessoa deixaria de estar ligado a certos conteúdos da internet, mas os sites não desaparecem, apenas perdem visibilidade.

Quais são as principais conclusões sobre a aplicação do direito ao esquecimento no Uruguai?

A. Consagração do direito ao esquecimento. O Tribunal entendeu que o direito ao esquecimento é transferível para nosso sistema jurídico por ser corolário de normas de raiz constitucional (Arts. 7, 72 e 332) e dos princípios extraídos da Lei de Proteção de Dados Pessoais. Além disso, diversos instrumentos internacionais - ratificados por nosso país - também seriam aplicáveis, como: a Declaração Universal dos Direitos Humanos (Art.12); o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Art. 17); e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 11).

B. Alcance do direito ao esquecimento. A Sentença indica que toda pessoa tem o direito de que seus dados pessoais não permaneçam na internet de forma permanente e indefinida (o que poderia "incitar à discriminação e ao ódio permanente") e, por esse motivo, pode solicitar a exclusão dos motores de busca e de outros sites online. Embora afirme que seria desejável que legislação futura fosse aprovada, o alcance da proteção do direito também deve ser analisado caso a caso, a fim de ponderar corretamente os demais direitos "em jogo" (à liberdade de expressão, ao acesso à informação, etc). Segundo o entendimento do Tribunal, o direito não implica "apagar" ou "ocultar" [a] informação, mas "supõe o direito da pessoa de não permanecer exposta ou vinculada por toda a vida a esses fatos nas redes sociais e na internet".

Reflexões finais

A discussão sobre a aplicação do direito ao esquecimento está longe de ser resolvida. No entanto, é claro que o aspecto principal de qualquer análise deve necessariamente considerar um "equilíbrio" entre o direito à informação e a intimidade e proteção da honra das pessoas em geral.

 

Montevidéu, 3 de abril de 2023

 


*Artigo meramente informativo elaborado com a colaboração da Proc. Gabriela Ripoll.

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la autora

ADVOGADA - SÓCIA

Dra. Maria Lucia Acosta

Doutora em Direito e Ciências Sociais, formada pela Universidade da República. LL.M com ênfase em Resolução de Conflitos (Distinção), Queen Mary University of London (Reino Unido), 2018. Bolsista da QMUL Latin American Scholarship.

Sua prática está focada em negociações de disputas pré-litigiosas, bem como em...

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